Breves apontamentos sobre a história da matriz de Aracati
Ao comemorar o 1º. Centenário de nossa cidade, julgámos oportuno levar ao conhecimento do público a curiosa história da Matriz de N. S. do Rosário de Aracati, que teve começo no ano de 1.714 Os apontamentos que se seguem foram escritos por Luíz Cândido Ferreira Chaves e se contêm num dos livros da tradicional Irmandade do S. S. Sacramento, sediada nesta cidade.
Estampamos a seguir, conforme o original, a interessante narrativa de Luíz Cândido Ferreira Chaves, escrita em agosto de 1.865, e oferecida á Irmandade do S. S. Sacramento, da qual fazia parte o referido autor.
“Esboçando aqui a história que se segue da nossa matriz isto é, da sua fundação até hoje (1865) daquilo mais saliente e útil para conhecimento dos presentes e futuros, que meus esforços e fadigas puderam colher em diversos lugares onde existiam livros que passaram a pertencer às antigas cabeças de Comarca, curados, sede da nossa matriz, Aquiraz, São Bernardo, Rio Grande do Norte, Capital da província, entendi, que descrevendo tudo quanto aqui vou dizer, faço um serviço importantíssimo, como útil a nossa Irmandade, oferecendo-o para memória, já que outros o não fizeram. Talvez que, para o futuro, seja este meu trabalho escarnecido e mereça acres censuras; seja como for; se alguém aprová-lo continue depois que eu deixar de existir, e pela negativa deixe ir a esmo. Disse.
Em Maio de 1714, foi construída uma pequena capela ou casa de oração coberta de palha, com frente de tijolo, e paredes de taipa; no mesmo lugar em que está a matriz colocada e isso pelos charqueadores de carnes que vinham da baía e Pernambuco, aonde celebravam missas os padres que vinham de São Bernardo, tendo a invocação de N. S. do Rosário.
Em Novembro de 1719, foi essa capela coberta de telha pelos mesmos charqueadores, trazendo a telha da Baía, fazendo os mesmos devastar o aluvião de carnaubeiras e inariseiras que tinham em derredor da igrejinha.
Em 1.728, acrescentaram rios mesmos charqueadores a capela, que as formigas, o cupim, as enchentes do rio tinham deteriorado; neste mesmo ano foram ofertadas por diversos devotos algumas coisas de prata […] ás mais imagens que foram colocadas na mesma igreja […]
Em 1736, achando-se a mesma capela […] das formigas e reiteradas enchentes do rio, sofreu grandes reparos no seu […]
Em 1.747, o padre José Lopes de Lima administrou o serviço de olarias de tijolos e telhas, a fim de se erigir uma outra capela em […] maior, e deu começo aos alicerces, levantando as paredes até certo ponto: ficou paralisada a obra por bastante tempo e afinal desabou tudo pelas rigorosas invernadas.
Em 1.761, o capitão-mor José Pimenta de Aguiar (Pardo), administrador e fundador desta Matriz , co aqueles matérias erigiu de novo a dita Matiz no ponto e posto em que se acha, demolindo tudo quanto estava feito pelo citado padre Lima. Não teve, porém, a glória de concluir a obra, por falecer logo.
Em 1.769, o capitão Manuel Rodrigues da Silva foi o último administrador da conclusão da Matriz até o seu cobrimento, ofertando ele á Matriz as imagens de São Vicente, São Francisco e N. S. da Boa Viagem. Fez ele uma especial sepultura de carneiro, que se vê na capela-mor, abaixo dos degraus de pedra, lado do nascente, a-fim-de ser sepultado nela – previlégio como último administrador; porém morrendo fora daqui conservou-se esse carneiro intacto até que nele foi sepultado o Vigário colado Joaquim de Paula Galvão, em 1847.
Em 1.773, fizeram a sacristia do lado nascente,m que até então não havia, mandando se vir da baía pedras e madeiras com que foram feitas as portas e portais da matriz, concluindo-se algumas obras do interior.
Em 1.779, foi elevada a categoria de Matriz, desanexando-se de todo da Matriz de São Bernardo.
Em 1.780, o bispo de Pernambuco, D. Tomaz da Incarnação deu previsão de 20 de Junho, criando a freguezia de Aracatí de N. S. do Rosário.
Em 1.785, foi rebocada toda a Matriz interiormente e no ano seguinte exteriormente, visto como até então eram suas paredes conservadas em preto.
Em 1788, deu-se a ereção da parte da torre do lado do nascente conservando-se esta também por muitíssimos anos sem se rebocar, o que se fez, quando foi a Matriz reformada.
Em 1.789, criou-se a Irmandade das Almas, que caducou em 1.837.
Em fins de 1.791, principio de 1.792, foi de novo coberta toda a matriz, por outro modelo.
Em 1803, veiu para a Matriz o sino pequeno da capela do glorioso São José, por ter siso demolida a capela do mesmo Santo, a segunda erecta no córrego denominado São José assim como muita madeira que foi comprada da mesma capela, para os serviço do consistório do lado do poente.
Em 1813, tendo sido demolida estupidamente a pequena capelinha se São Gonçalo, onde tem casa Francisco de Paula Martins, no beco da feira nova, foram transladadas para a matriz as imagens de São Gonçalo, Santo Amaro, altares e demais objetos da dita capela.
Em 1814, veiu de Pernambuco a entalha da capela-mor, custando 620$000 a qual foi colocada pelo carpina Correira de Sá.
Em 1816, em 26 de Outubro, foi a Matriz de N. S. do rosário transferida para a Irmandade do S. S. Sacramento, por escritura pública, com os seus bens e alfaias, estipulados por certos homens, como se vê pelo termo de compromisso feito pela instituição da mesma Irmandade, ficando por conseguinte extintas as irmandades do S. Bom Jesús dos Passos e a da mesma Padroeira, persistindo sómente a do S. S. Sacramento.
Em 1817, teve princípio o consistório e a sacristia do lado do poente, e só em 1819 foi ultimada a obra, ficando por conseguinte servindo esta para a Irmandade do S. sacramento, e a velha, do nascente, para a fábrica ou serviços do Vigário.
Em 1818, foi dourado o sacrário e os dois ninchos do altar-mor, colocando-se em um a padroeira (N. S. do Rosário) e em outro São Vicente. Nesse mesmo ano, veiu o Pernambuco o S. Bom Jesús, substituindo o de vulto pequeno que foi trocado para a capela de Sucatinga.
Em 1819, concluída a obra do consistório, veiu nessa mesma ocasião de Lisboa, o S. Bom Jesús Morto, mandado vir pelo Capitão-mor João da Silva Muniz, o Sargento mor Costa Barros e outros irmãos da Irmandade do S. Sacramento. Nesse mesmo ano, foi mandado forrar, pela Irmandade do Sacramento, de táboa o teto da capela more, logo depois de concluída a obra, passou-se o sacrário para a capela mor, visto como estava até o forro então no altar da Conceição por causa da obra da entalha e mesmo dado o forro do teto. Ainda nesse ano, a Irmandade mandou vir da Baía uma imagem de N. S. da Conceição, e de Lisboa, as lanternas de prata.
Em 1820, foi feito o altar das almas, conservando-se por pintar e dourar até 1844, e em 1845, foi mandado dourar pela irmã D. rosa Pacheco, senhora de Domingos José Pereira Pacheco.
Em 1821, foram postas as duas tribunas da capela mor pelos irmãos Capitão-mor Manuel Lourenço da Silva e Capitão José da costa Silva, com a prerrogativa de servirem somente para as suas famílias enquanto eles vivessem, por terem eles feito todas as despesas. Nesse mesmo ano, caiu o cruzeiro, desabando todo o pedestal, sendo mister erigir-se todo de novo e por melhor gosto.
Em 1824, à noite, quando de volta da procissão dos Passos e que faziam-se as cerimônias na igreja, um grande tufão de vento apareceu com tão medonho estrondo que fez voar grande porção de telhas ao longe, ou […] ou povo arrojando para fora da […] caíssem uns sobre os […] a fazer horrer, ficando desta arte muitas pessoas com confusas, […] de reparo no dito telhado.
Em 1826 foi roubada a lâmpada de prata, que dificilmente foi encontrada intacta á porta da sacristia velha do poente. Nesse mesmo ano, a Irmandade, por desgosto e despeitada, faz entrega de confraria e bens ao Juiz Comissário e de ausentes, para manda-la por sos uma administração; e por isso mereceu acres censuras no provimento de correição, como se vê no livro das atas, folha 18; voltando tudo depois aos princípios primitivos continuou a funcionar a nova Irmandade eleita. Nesse mesmo ano houve divergências da Irmandade com o Vigário encomendado Carlos Manuel de Saboia por querer este expelir da matriz o Vagário colado Felix Antônio de Gusmão melo, chegando a ponto de mandar este tocar rebate ao sino, dando assim lugar a que o povo se amotinasse em favor do vigário colado, originando-se disso certos conflitos aos quais a Irmandade não pode retorquir. Uma Irmandade de homens mais circunspectos levou o caso avante , e deu lugar a que o bispo de Pernambuco tomasse providências(vede o livro das atas, fl. 23). Até esse tempo (1826) fazia se o custeio da Matriz por cada uma das irmandades, isto é: a do senhor dos Passos, relativamente ao altar de S. Miguel; a de N. S. do Rosário quanto ao altar da dita senhora, e a do S. Sacramento quanto ao altar mor, e logo que se anexaram segundo as escrituras públicas, correu o custeio dos mais altares por conta da fábrica.
Em 1827, por Helena de tal foram ofertadas diversas imagens à Irmandade, como: São Miguel da paciência, Santa Ana e por Irene de tal as imagens de Jesus, Maria e José; e pela senhora de João Dias Muniz um rosário de ouro a N. S. do Rosário.
Nesse mesmo ano, a Irmandade mandou vir do Rio do peixe a cópia do compromisso de lá, para formular o seu, sendo posto em execução em 1832, pois com esse lapso de tempo urgia a Irmandade ter outro, visto as mudanças do tempo, das cousas e das inteligências dos homens, por isso que há anos tratava de uma reforma radical do mesmo, sem que houvesse êxito.
Em 1.829, foi doada pelo irmão Francisco José da Costa Barros uma imagem do Senhor crucificado, e de marfim, sob condição de não ser alheiada nem emprestada; do contrário estaria, ipso factro sem efeito a dita doação, voltando a imagem aos herdeiros de F. José da Costa Barros. O tesoureiro João Francisco ramos, porem, prescindindo do estipulado no termo de doação, deu a referida imagem na estima de 50$000, a Vicente José Zaranza, por ato da Semana Santa, em 1852, pelo que os herdeiros de Costa Barros trataram de reivindicar o domínio da dita imagem. Em 1875, por ocasião da correição que fez o Juiz de Direito Francisco de Assiz Oliveira Maciel, fez com que a imagem voltasse para a Matriz.
Em 1.829 e 830, edificou a Irmandade três casas térreas á Rua que lhe deu o nome – R. do Sacramento – e comprou outra á Rua da Cadeia. Em 1.851, a Irmandade, para pagar o que devia aos herdeiros do finado Domingos José Pereira Pacheco, fez arrematar essas propriedades para a solução da dívida, assim mais uma porção de gado e ovelhas que tinha na fazendo do Palhano. Lamenta-se verificando-se os livros de receita e despesa, a maneira como foram consumidas consideráveis somas que tinha a Irmandade em saldo, em pompas e festas da Semana Santa, por que então não se usava subscrição entre os habitantes. Tempos depois foram essas festas feitas entre Irmandade regedora e fiéis.
FONTE: O JAGUARIBE
DATA: DOMINGO, 25 DE OUTUBRO DE 1942.
p. 9.
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